Idosos em um Mundo Digital: Desafios, Respeito e Inclusão

idosos

Por: Márcia Lino

Introdução

Em uma sociedade cada vez mais conectada, onde a maioria dos serviços migrou para plataformas digitais, uma parcela significativa da população se vê à margem da inovação: a geração analógica. Composta, em grande parte, por idosos, ou seja, pessoas com 60 anos ou mais — os chamados “baby boomers” ou aqueles nascidos antes da década de 1980 — essa geração enfrenta diariamente barreiras para acessar serviços básicos e exercer plenamente sua cidadania em um mundo onde um simples QR Code pode decidir entre o acesso ou a exclusão.

Idosos entre o progresso e a exclusão

Segundo dados do IBGE de 2023, cerca de 32 milhões de brasileiros têm 60 anos ou mais, representando aproximadamente 15% da população. Apesar do avanço na inclusão digital, apenas 54% dos idosos utilizam a internet com frequência, sendo que muitos ainda enfrentam dificuldades com smartphones, senhas, aplicativos bancários e autenticação por biometria. O que para gerações mais novas é intuitivo, para muitos idosos representa uma barreira quase intransponível.

A digitalização de serviços públicos e privados, como agendamento de consultas médicas, pagamento de contas, transações bancárias e até a compra de passagens de transporte, se transformou em um obstáculo cotidiano. Muitos idosos relatam constrangimentos em filas de autoatendimento, caixas eletrônicos e até em supermercados que exigem apps para descontos.

Ouvi recentemente o relato de um casal amigo que vivenciou uma situação constrangedora ao tentar comemorar seu aniversário de casamento. Ao chegarem a um restaurante, perceberam que o estabelecimento não disponibilizava cardápios impressos — apenas a versão digital acessível por QR code. Sentindo-se desconfortáveis em pedir ajuda para utilizar a tecnologia, decidiram deixar o local, frustrando a celebração da data especial. Episódios como esse evidenciam, de forma sensível e concreta, a necessidade urgente de políticas e práticas mais inclusivas no processo de transição digital, especialmente para garantir a participação plena de pessoas idosas nos espaços sociais.

O peso do etarismo digital

Além da exclusão prática, há o peso emocional e social. O etarismo digital — preconceito contra pessoas mais velhas no uso da tecnologia — muitas vezes é disfarçado de impaciência ou negligência. Quando uma atendente ignora o idoso que não entende o aplicativo, ou quando alguém solta um “isso é tão fácil, como você não entende?”, reforça-se uma barreira invisível e dolorosa: a do desrespeito.

A tecnologia, por mais revolucionária que seja, não deve se transformar em obstáculo. Pelo contrário: deve servir à inclusão, à dignidade e à cidadania de todos.

Caminhos para a inclusão digital

Felizmente, há iniciativas e soluções que apontam para uma convivência mais respeitosa e acessível. Eis algumas delas:

  1. Capacitação continuada – Diversas ONGs, Bibliotecas Públicas e Universidades oferecem cursos gratuitos de informática para idosos. O programa “Inclusão Digital da Terceira Idade”, promovido por Universidades como a UFMG e a USP, tem se mostrado eficaz no letramento digital dos mais velhos. 
  2. Design universal – empresas que adotam princípios de acessibilidade digital, como letras maiores, comandos por voz, layout simplificado e suporte por telefone, facilitam o acesso para todos. Bancos como o Banco do Brasil e a Caixa Econômica têm investido em versões simplificadas de seus apps voltadas ao público idoso. 
  3. Apoio intergeracional – Incentivar netos, filhos e vizinhos a ajudarem os mais velhos nas tarefas digitais é uma prática poderosa. Projetos como o “Conecta Jovem”, que reúne voluntários para ensinar tecnologia a idosos, mostram que a empatia entre gerações é um elo transformador. 
  4. Manutenção de canais analógicos – Não se trata de impedir o avanço digital, mas de preservar alternativas acessíveis. Atendimento presencial, linha telefônica com atendimento humano e emissão de senhas físicas são recursos que não devem ser eliminados. 
  5. Campanhas de conscientização – é urgente promover campanhas públicas e privadas que conscientizem sobre o direito do idoso à acessibilidade digital e ao respeito. Isso ajuda a combater o etarismo e cria uma cultura mais empática e solidária. 

Um convite à empatia

A transformação digital é irreversível e desejável — mas ela só será verdadeiramente positiva se incluir todos. É hora de olharmos para a geração analógica não como “atrasada”, mas como guardiã de experiências, histórias e sabedoria, que merece ser acolhida com respeito neste novo tempo.

Promover ambientes digitais mais inclusivos não é apenas uma questão de cidadania: é uma forma de reconhecer que, um dia, todos nós seremos os “desatualizados” de uma nova era. E o que esperamos, quando esse dia chegar, é o mesmo que a geração analógica pede agora: paciência, compreensão e acesso digno aos serviços que a sociedade oferece.

Programas de Inclusão Digital para Terceira Idade

Curso gratuito da USP de São Carlos ensina Idosos a utilizar o computador

A atividade tem como objetivo introduzir pessoas com 60 anos ou mais ao uso básico do computador, promovendo autonomia digital no cotidiano. Para informações mais detalhadas, clique no botão, para acessar a página da USP.

Programa Envelhecimento Ativo, da UFMG

O Programa Envelhecimento Ativo oferece uma variedade de cursos e atividades voltados ao público idoso, entre eles o curso “Como usar o Celular”. A proposta é ensinar o uso funcional do aparelho, promovendo maior autonomia no manuseio e na exploração de seus recursos. A atividade é indicada para quem deseja se familiarizar com as funcionalidades dos celulares de forma prática e acessível.